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segunda-feira, 22 de junho de 2020

Vigésimo sexto capítulo - A Ponta do Caiaque Azul !



                     Gervásio buscava informações para novo trabalho da Universidade e seus questionamentos sobre preservação do meio ambiente, e nesse contexto a flora, a fauna, o eco sistema o direcionavam para diversas leituras. Procurava manter o foco, no entanto, interessava-se por quase tudo relacionado à vida marinha. Nenhum detalhe escapava. Lógico que depois ele filtrava o que fosse pertinente ao trabalho solicitado, mas salvava todos os links que julgava importante.  Tantas informações, mesmo porque suas buscas já eram em si um filtro qual uma bússola que aponta corretamente o norte.   O seu norte foi sacudido pelo toque da campainha. Como detestava ser incomodado quando queria o silêncio, e a pessoa insistentemente batia palmas e repetia o toque.  Irritante, não era a atitude, mas o som estridente daquela campainha elétrica.   Resolveu fingir que dormia. E pensou?  E se for importante?  Levantou-se, foi até a janela, e por uma das frestas viu que era o mesmo homem que viera pedir roupas à semana passada.   Sua mãe atendera e separou algumas roupas velhas fazendo um pequeno embrulho, porém ela disse ao homem: 

  ___Volte a semana que vem!  Eu separo mais roupas!    Gervásio ouviu, e lamentou comentando com a mãe:

___ Ele vai voltar minha mãe, essa gente vive disso.  Leva roupas e distribui ou vende para algum brechó.  Pode reparar que ele veste-se bem.   Certamente, ele troca com outras pessoas, veste-se, e sai por ai.  Pra ele é bom negócio.

___Pode até ser, meu filho. Pode ser.  Ele que faça o que bem quiser.  Mas veja bem, ele volta sempre às segundas-feiras. É um ponto positivo. Claro que não gosto quando ele toca com insistência, talvez seja sua marca. Assim, as pessoas ou ajudam rapidamente, ou ignoram sabendo que é ele de novo.  Riu D.Teresa da sua conclusão.

           Desta feita sua mãe não estava em casa aquela hora. Lamentou o socorro ausente.  Da própria janela ele atendeu falando um pouco mais alto:

___Boa Noite!  Amigo! Por favor minha mãe saiu pro trabalho e não sei o que ela separou para o senhor. Volte a semana que vem, por favor!

___Sim Senhor, obrigado!  Diga à D.Teresa que ela pode levar as roupas na praia que eu pego lá, na próxima segunda-feira.

           Gervásio não aguentou, quis passar um sermão no Homem.

___Amigo, eu acho que quem deve resolver isso é ela.   O Padre Àlvaro deve ter alguma doação na Igreja. Vai lá!  Quem sabe?

___Padre Àlvaro me dar roupas?  Desisto.   Ele entrega tudo para o Grupo de Idosos costurar e vender. E não pense que vende barato, viu?  
 
___Eu sei disso, porque cheguei a comprar roupas no brechó da Igreja.  Estou usando calça e camisa, roupa boa moço! respondeu em voz forte e Português de quem recebeu bom estudo.

      Gervásio visivelmente constrangido, por detrás da janela tentava enxergar o rosto do homem. Pediu para ele esperar um minuto.   Resolveu ir até a porta e vê-lo pessoalmente.  Deixou seu orgulho, e por que não, o seu orgulho, orgulho que lhe deixou envergonhado.

           Abriu a porta e aproximou-se do portão.   Observou o Homem que segurando algumas sacolas, trazia a sua mão esquerda por debaixo do braço, abraçando, um livro importante chamado '' Língua e Realidade'' de Anatol!
         
____Meu Deus! Meu Deus!   Que livro maravilhoso esse que o senhor traz em suas mãos!

Interrogar Socraticamente ?   Respondeu assim mesmo o Homem de boa aparência, apesar da barba por fazer e cabelo em desalinho.

___ Interrogar Socraticamente?   kkkkk  Gargalhou Gervásio. Relembrando que ele falava da dialética de Sócrates, a sua maneira de pensar.  Novamente, Gervásio ficou mudo com sua pequena e atrevida arrogância jogada, atirada, escorraçada ao chão.

___Qual o nome do Senhor!  Perguntou Gervásio, tratando-o com um pouco mais de respeito.

____Meu nome é Hypollite ou pode me chamar de Hipólito.  Meu Pai me batizou em homenagem ao educador do método Pestalozzi, aquele que depois converteu-se, ou melhor, codificou a Doutrina Espírita. Sabia que ele foi rigorosamente científico?  Ele não acreditava em nada disso, mas as manifestações pipocavam por toda a França e era preciso separa o joio do trigo.  Muitas fraldes, mistificações, pessoas ludibriando e tirando vantagens financeiras sobre pessoas que precisavam apenas de um conselho bom, uma orientação, por exemplo, de como lidar com a perda de um parente, às vezes um filho, a mãe, um amigo muito próximo.   Mais tarde sob o nome que adotou de Allan Kardec, nome de uma sua vida passada como Mago Druida, nome este que lhe foi revelado em uma sessão espírita, ele como grande educador e bem conceituado na sociedade francesa de então, assumiu definitivamente a crença de que vivemos além desta vida.

___Bem Senhor Hipólito!  Quero pedir-lhe perdão, e perdoe a minha ignorância sobre esses assuntos de espiritualidade, mas quanto a obra literária de Anatol...ahhh poderemos conversar horas e horas.   Façamos o seguinte, quando o Senhor voltar na próxima segunda-feira, pode me chamar pelo nome, e confesso ao Senhor...eu detesto o som desta campainha. Acho que vou trocar por um sino!

___Verdade Senhor???

___Gervásio!    É diferente né?  Ficamos nós com os nomes diferentes!

              Positivamente!  disse Hipólito.

___Ficamos combinados?   Ahhh e retorne com seu livro!

___Eu posso deixá-lo aqui por uma semana, se prometer que vai ler.  Aceita ?

___Aceito sim.  Eu li um exemplar na biblioteca da Universidade por sugestão de um Professor, que disse que é um bom roteiro de técnica de estudo.   Prometo que vou ler!

               O Homem entregou o livro que estava encapado com plástico transparente. Ao segurar o livro Gervásio sentiu uma emoção diferente, como se estivesse passando por um filme, e parecia que agora aquele senhor lhe era mais familiar.   Ouvia baixinho um batuque de samba, um pandeiro cadenciado, e sentia uma enorme vontade de ficar descalço na areia gingando como faz um lutador de capoeira.  Sentiu uma vertigem, e uma canção ....'' Pode ser a gota d'água!  E qualquer desatenção...faça não. Pode ser a gota d'água !"  Sentiu o corpo desfalecer...e foi escorrendo as costas na parede.  Apagou a consciência. Sofrera um desmaio!  O retumbar de tamborins ressoavam ao longe...'' Pode ser a gota d'água!"

               Acordou sentado à sombra de uma árvore diante de sua casa, tendo ao redor, a visão que foi voltando lentamente, algumas sombras confusas, imagens duplas, sobre postas, seus sentidos que sempre foram aguçados estavam dominados por alguma força estranha.   Sentiu seu corpo doendo da cabeça aos pés.     Falava palavras desconexas, um tipo de dialeto africano.   Procurou firmar o pensamento, e então, aquela voz forte de novo, a voz do senhor Hipólito:   ___Pensa em Jesus Cristo!  Respire mais fundo e Pensa em Jesus Cristo!  Fique calmo e respire, respire.  Isto, assim mesmo1 Vai ficar tudo bem! Pensa no Mestre Amigo! Pense em Deus!  Se estiver me ouvindo melhor, reze uma Ave Maria.

             Gervásio tentava organizar seus pensamentos e recuperar as forças. O que foi aquilo? A visão, o som, o samba, o pandeiro, a ginga de capoeira? Era como se ele fosse outra pessoa, e ao mesmo tempo não era. 

           Rezou, rezou a Ave Maria com todas as forças de seu coração. E foi ficando melhor, ''as vistas'' voltando, o coração se acalmando.
 
              Olhou para cima!  Viu diante dele o Senhor Hipólito com as mãos a uma certa distância, ele de olhos fechados aplicava-lhe passes magnéticos, sem tocar sua cabeça e nenhuma parte de seu corpo.   Ele sentia a vibração percorrendo cada célula, uma certa quentura e um leve perfume doce de alfazema.   Em volta do banquinho que estava, e nem se apercebera disto, um ajuntamento de pessoas. Reconheceu a mãe que aflita segurava um lenço enxugando as lágrimas, e o Pai que acabava de chegar correndo, pedindo licença para ver o filho, sem entender aquele movimento em frente a sua casa.  Viu seu filho sentado, e D.Teresa chorando.

                A própria D.Teresa mesmo chorosa, tratou de amansar, digamos assim, o senhor José Simão.

___''Tá'' tudo bem Zé!  Ele apenas teve um desmaio.   Foi só um susto, nada demais.

               D.Teresa tomou conta da situação, porque não iria dizer ao marido que o filho estava vendo coisas. Sua formação católica muito forte, e apesar de tudo, respeitava essas manifestações, que aconteciam com certa regularidade, porém aconteciam na Praia, nas festas de Yemanjá, com grupos religiosos de Umbanda que vinha da cidade para comemorar o dia dela.   Ela e a família assistia à distância, sem participar ou interferir, sempre respeitando a crença de cada um. Achava bonito ver as danças, aqueles vestidos brancos, os homens de branco, e os lindo colares, sendo que alguns eram feito com contas coloridas.   Desconheciam totalmente o nome das entidades que ''baixavam'', como se costuma dizer.   Ela conhecia Templos que havia na Vila, sem nunca ter pisado, ou ser convidada para conhecer.   Amava sua Igreja, ouvia as homilias de Domingo, comungava, e rezava o terço todos os dias. Amava Jesus, Maria e principalmente Deus, o criador de todas as coisas!


____Quem é esse Homem colocando as mãos sobre meu filho? 

____Estamos rezando José, e ele esta bem melhor. Vê a cor do rosto?  Ficando corado, há alguns minutos ele estava branco como a sua camisa.

___ Filho, filho?  Olha prá mim! Olha!   falou super aflito para Gervásio.

___Oi meu Pai, é você mesmo?   Estou...estou vendo! Graças à Deus!

___Claro que sou eu, e aqui ao seu lado , sua mãe!  Diga meu nome

___José!

___ E sua mãe ?

___Teresa

             E este senhor em pé, meu pai, é o Senhor Hipólito ! Foi ele que me socorreu!

___Muito obrigado, Senhor! 

             Hipólito falou: -   É melhor levarem ele para dentro, e ele tomar um copo de água com açúcar, parece que ele esta precisando comer alguma coisa.  O sol forte pode ter causado alguma alucinação.

            Hipólito sabia que o rapaz sofrera algum tipo de manifestação mediúnica. E pelas característica Gervásio possuía um mediunidade rara que é pelo toque em objetos. Julgou melhor não falar em mediunidade, ele já conhecia a religiosidade de D.Teresa, principalmente não queria revelar-se tanto em relação às suas próprias crenças espiritualistas.   Ele frequentava um Centro Espírita de orientação Kardecista, não era de Umbanda, embora elas professem a mesma crença maior em Jesus Cristo, Oxalá!

             Senhor Hipólito agachou-se próximo aos joelhos de Gervásio, segurou-lhe as mãos e disse de forma carinhosa:     ___Não se assuste com o que aconteceu hoje. Segue normalmente a vida.  Tudo será explicado no devido tempo.   E entregou-lhe de volta o livro que caíra ao chão.   Ao mesmo tempo deixou em suas mãos um pequeno pedacinho de papel com algo escrito.

___Dobre e guarde em seu bolso!   Fique com Deus!   Repouse neste dia!  Obrigado por tudo.

___Sou eu quem agradeço senhor Hipólito! Ainda bem que o Senhor estava aqui para me socorrer! Estou imensamente agradecido.

___D.Teresa!  Senhor José!   Com sua licença eu preciso ir andando, ainda preciso pegar roupas em outras casas.
     
___Espere !     D.Teresa foi apressada para dentro e voltou a seguir com um pequeno pacote.

___Não esqueci do Senhor. Eu consegui roupas com minha amigas da Igreja. Pegue!

        Emocionado, ele olhou para Gervásio e disse sorrindo:

___Deus trabalha de maneiras estranhas!

            Enquanto Hipólito fazia este comentário, Gervásio aproveitou para ler o pequeno pedaço de papel que estava escrito:

                   A Ponta do Caiaque Azul!

Hipólito percebeu e fez a mímica de guardar algo no bolso.   De imediato Gervásio atendeu seu sinal!



             

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