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quarta-feira, 27 de maio de 2020

Décimo terceiro capítulo - O PEIXE VIVE PELA BOCA!


              



              Prefeito Bastos quase não dormiu aquela noite, após a reunião com o tal sujeito misterioso, o seu ''chefe''. Estava profundamente dividido entre sua lealdade e a perspectiva que se apresentava à sua frente com aquele projeto apresentado por Gervásio, e não lhe agradava em nada saber que seus passos estavam sendo vigiados. Sabe-se lá se os passos de todas as pessoas com quem mantinha negócios e contato. Se ele já era desconfiado, quanto mais agora. Passaria a desconfiar da própria sombra. Ele se julgava inteligente, um bom articulador, e negociante. As lembranças de sua juventude e os ideais que antes professava coincidiam tanto com os ideais de Gervásio.  Em casa no contato familiar suas duas filhas questionavam suas atitudes. Eram pré adolescentes que começavam a ter igualmente seus sonhos. Filhas gêmeas e algumas situações eram bem engraçadas, quando Júlia e Alexia falavam ao mesmo tempo, e a mãe pediam para falarem com mais calma. Os noticiários às vezes favoráveis, outras vezes contra as decisões tomadas pelo Prefeito chegavam aos ouvidos das duas ou quando colegas de escola faziam perguntas.   Estudavam no melhor colégio da cidade administrado pelas Freiras do Carmo originárias da Itália. Foi sugestão de Giovanna a mãe,  filha de Italianos da cidade de Genova.
                     Contavam naquele momento com 16 (dezesseis) anos. São parecidas que até os pais confundiam-se  ou então, as meninas brincavam com isso trocando os respectivos nomes. Mas com o tempo aprenderam a distinguir pelo tom de voz, embora elas até nesse detalhe imitavam-se. A melhor alternativa às vezes ficava no penteado, uma prendendo o cabelo com tranças, e a outra deixando solto.  Porém, isto funcionava para os pais, jamais para os habitantes da vila.  Corria inclusive uma piadinha a respeito.  As pessoas diziam que na dúvida o melhor seria :-   '' Perguntem às gêmeas!" e outra pessoa tornava a perguntar:

____ Mas qual delas irá responder?
____Ora, qual diferença faz, são filhas do Prefeito!

                   A piadinha fazia referência ao dúbio ou duplo comportamento do Prefeito Bastos que nas entrevistas, ora dizia uma coisa, ora dizia outra.  Foi quando um repórter comentou baixinho entre os colegas:

'' Melhor perguntar às gêmas!"  E nasceu a piada.

                  No escritório de sua residência e sede da Prefeitura, Bastos pegou de seu laptop, entrou no site da Cooperativa e digitou uma senha particular que lhe dava acesso à ata da reunião daquela noite. Encontrou o ante projeto, ainda não aprovado evidente, que Gervásio tivera o cuidado de salvar em formato .pdf, imprimiu uma cópia.     Fazendo assim ele pode evitar o constrangimento de dizer que havia perdido na água ao fazer a travessia na Balsa.    Pensava consigo :   '' a sombra que me segue talvez seja alguém que opera na Balsa''.  É um ponto de referência, muitos utilizam a balsa, mas quem vê e quem vai, opera a balsa. Enfim.
  
                  Aquela conversa com o misterioso chefe, e questionava o fato de que, ele era subordinado a uma espécie de fantasma que detestava que seu nome fosse mencionado, no entanto o pai de Gervásio o conhecia, e se pesquisa-se direitinho Bastos conseguiria descobrir quem era o seu próprio chefe.

                 Como iria cumprir a promessa de construir um aeroporto, e onde ?   Começava a articular maneiras e modos além de buscar orientação com seus colegas partidários.  Melhor não envolver seus colegas de partido nessa história, porque onde há fumaça há fogo, e um peixe morre pela boca!

                Foi quando teve a ideia:    O PEIXE VIVE PELA BOCA!  Simmmm, achei a solução.   Este será o slogan que vamos adotar !   Logo pela manhã irei conversar com Gervásio e Maria Antonia!

               O dia logo amanheceu, Josias Bastos dormira pouco mais que 4(quatro) horas e apesar do pouco descanso sentia-se animado.  Giovanna preparou um café reforçado para ele. Deixou sobre a mesa do escritório uma bandeja com biscoitos amanteigados e mais três xícaras à disposição. Um bulê de chá mate caso alguém não gostasse de café, bem como algumas torradas.  Sua mesa não era imensa feita a mesa do ''chefe'', além do que o espaço era suficiente apenas para uma mesa e 6(seis) cadeiras.    
                Conforme o combinado Gervásio ligou por volta das 07:30 e Giovanna confirmou que ele e Maria poderiam comparecer naquela manhã à Prefeitura.   Gervásio repassou o recado para Maria que já se antecipara na viagem, por conta de necessitar ir até a Vila fazer algumas compras. Portanto, ela acordara 1(uma) hora mais cedo.  Ela queria discutir com o Prefeito essa dificuldade de acesso , ou melhor, essa demora no transporte desde a sua vila no Mangue até à sede da Prefeitura.   Surgira em sua mente a ideia da criação de uma sub Prefeitura nos moldes das existentes em outros municípios vizinhos.  Tinha certeza de que o Prefeito ia gostar da ideia, porque isto granjearia muito votos, aliás muitos votos mesmo. A população ribeirinha do Mangue era tão numerosa quanto à população da Vila dos Pescadores junto ao litoral.  A sub Prefeitura seria um bom acordo à ambas as partes, e estreitaria os laços de relacionamento político da conhecida líder com o Prefeito Josias Bastos.   O que Maria desconhecia era que esta ideia da sub Prefeitura também passara pela cabeça de Gervásio. Quando o celular deu alerta de mensagem Maria já estava a caminho da Prefeitura trazendo seu carrinho de compras bem cheio de caixas de leite, sendo que metade delas eram de leite semi desnatado. Uma das crianças do Mangue tinha alergia ao leite integral e o leite semi desnatado, bem melhor para a saúde dela estava em falta por lá.

              Gervásio trouxe com ele novamente cópias do ante projeto.   Enquanto tomava seu café na sua mini sala oval de reunião o Prefeito Josias Bastos rascunhava alguma coisa em seu caderno. Desenhava um peixe de boca aberta com ovas saindo às gorgotas, ou seja, aos montes. Aquelas ovas de peixe de cor alaranjada, ovas que são recolhidas nos criadores para inseminação artificial. Rabiscava seu desenho de peixe e pesquisava no laptop artigos sobre técnicas de inseminação.

                Gervásio dirigia o carro da Cooperativa e no bagageiro colocara uma caixa de poliuretano fechada por travas, repleta de tilápias devidamente cobertas de gelo. Sua intenção era fazer uma breve explanação à alguns pescadores sobre as vantagens da inseminação.
              
                Ao avançar pela Avenida Central José Simão, que levava o nome de seu avô, viu Maria caminhando pela calçada, buzinou para ela e deu-lhe carona colocando seu carrinho no banco de trás da caminhonete cabine dupla.    Gervásio tinha concluído seu curso de motorista e trazia uma autorização para dirigir enquanto sua carteira,  em breve,  seria entregue pelo correio.

                 Maria agradeceu a carona porque estava cansada de puxar o carrinho desde o mercado.
_____Porque não me ligou Maria, eu teria vindo pra te ajudar ! disse Gervásio
_____Imagine! Você já ajuda muito sua família e tem outras coisas com que se preocupar. respondeu
_____Exatamente!  Preciso de você com saúde!  falou sorrindo e bem disposto.
_____Hummm, muito obrigado pela gentileza! Vejo que está bastante animado.

              O Prefeito olhando seu rabisco sobre a mesa estava absorvido e coçando a barba. O interfone próximo à sua mão direita tocou. Ele segurou o botão de viva-voz.

_____Prefeito !  Senhor Gervásio e Maria Augusta!
_____Ahhh sim! Pode deixá-los entrar, por favor !

           O diálogo foi formal mas ambos eram respectivamente o Prefeito e a Primeira Dama.

             Conduzidos à sala o Prefeito nem esperou que se aproximassem indo ele ao encontro dos dois, cumprimentando-os e ofereceu o café ainda quentinho, bolachas e torradas.
               Gentilmente afastou uma cadeira, mostrando seu cavalheirismo para Maria Augusta, que lisonjeada, fez um comentário ao Prefeito: _

____Sua esposa está cada vez mais linda! Nos recebeu muito bem!
____ Que bom! Vou aumentar o salário dela, assim ela ficará mais tempo no salão de beleza.

                Bom, vamos tratar de assuntos mais belos ainda?
____Muito belos Senhor Prefeito, mas com algumas rugas, nada haver com sua esposa, digo de passagem, falou ironicamente Maria Augusta.

_____Você também é bela, e sempre ferina ! afirmou o Prefeito

_____Não posso fugir à minha natureza, e ao lugar onde nasci e fui criada.

_____Eu garanto que todos nós aqui sairemos depois mais leves e mais felizes. Assentiu positivamente erguendo o polegar.

          Vamos então conversar . Tenha a palavra Maria Augusta.
_____ Senhor Prefeito!
_____Por favor, deixemos a formalidade de lado, me chame de Bastos ou Josias!
_____Como quiser, então...Josias, como todos sabem em reservas ou áreas de preservação ambiental o órgão que regula a entrada e a saída de pessoas é o IBAMA - Instituto Brasileiro do Meio Ambiente, e só autoriza a presença de pesquisadores e estudantes. Eu e minha irmã temos uma preocupação constante com o Mangue que é tão importante quanto o Atol...

___ O Atol das Rocas? interrompeu Gervásio 
___Desculpe a interrupção Maria...falou gaguejando Gervásio que digamos, mordeu a própria língua, antes que '' desse com a língua nos dentes''!  Precisava conter-se.

____Sim...é o Atol das Rocas, conhece?
____Já li algo a respeito!
____Tenho certeza que leu! Piscou o olho para ele.

        Gervásio captou a mensagem, Maria falava daqueles papéis que deixara com ele. Estava envergonhado.
____Como ia falando... O Atol das Rocas é a maior colônia de aves marinhas do planeta com cerca de 150 mil espécies.  Eu não digo....Josias...que o Mangue tenha essa quantidade, mas não fica para trás. Pode até ultrapassar esse número se adotarmos uma administração forte, porque a diversidade não fica apenas em relação às aves marinhas, lá no Mangue a exemplo do Atol encontram-se peixes, aves, crustáceos, moluscos, entre outros. Talvez o Prefeito saiba que muitos turistas que lá nos visitam, contam entre eles com a presença de pesquisadores e estudantes.  Josias, digo Josias Bastos, o Prefeito sabia perfeitamente do que Maria estava falando.  Toda essa riqueza não pode ficar à Deus dará sem os cuidados que ela merece. De acordo com alguns pesquisadores com quem conversei, eles estão dispostos a formalizar conosco uma campanha de preservação do Mangue, e creio que podemos formar uma parceria nesse sentido.  Minha principal sugestão para isso é estabelecer no Mangue uma sub Prefeitura. Outra questão, importantíssima, Josias!  Chega de balsa que leva 1(uma) hora de travessia, queremos uma Ponte, uma bela Ponte. E antes que eu me esqueça, agora esta é também com o Gervásio... Esse seu projeto , isto é, seu ante projeto de inseminação igualmente aplica-se à reprodução de crustáceos?

_____ Vamos deixar o Prefeito responder suas questões, depois na minha vez eu responderei essa , tudo bem ?

_____ Obrigado pela deixa...riu o Prefeito.  Amigos, posso chamá-los de amigos? Sim, eu mesmo respondo que posso, porquê já respondendo aos dois, eu concordo com a criação da sub Prefeitura, eu concordo com o Projeto do Gervásio com algumas ressalvas, e a construção da Ponte é um projeto que a Prefeitura tinha engavetado, mas diante de tantas possibilidade possíveis iremos buscar financiamentos bancários para verdadeiramente fazê-la sair da gaveta.   Afinal de contas Maria Augusta não é justo que você e toda uma população precise da sua ajuda apenas para comprar leite. Aqui se produz muito, porém nem tudo se consome. Nossa produção de alimentos é distribuida para outros municípios que veem aqui com as peruas das outras Prefeituras. É uma prática, no entanto, que esta diminuindo. Antigamente vendíamos tudo o que produzíamos, e saiba Gervásio que você não é o único que busca na inseminação a solução para aumentar a produção de peixes e inclusive os crustáceos.    Portanto, a construção da Ponte se faz urgente e necessária para escoar a nossa produção, e a produção de outros municípios vizinhos.  Os tempos são outros, novas tecnologias estão surgindo, os veículos de comunicação aproximam coletividades. O mundo ficou pequeno, e temos acesso à tanto conhecimento pela Internet. Nossos filhos estão nos ensinando, pois é!  São eles que trazem respostas às nossas perguntas.  A mentalidade dos políticos precisa mudar. Desculpem se o que estou falando possa parecer um discurso político, em absoluto, é a constatação de que se não mudarmos ficaremos muito atrasados, e até esquecidos.   Vejo com bastante entusiasmo o que vocês dois estão buscando realizar, e assumo aqui, hoje e agora, de oferecer todo o apoio que precisarem! Portanto, escrevam ai este Slogan :     O PEIXE VIVE PELA BOCA!

            Gervásio ficou de queixo caído!   Maria Augusta idem, que subitamente perguntou:

_____Tem ressalvas para mim, Senhor Prefeito Josias Bastos?

_____ É mesmo, né ?   A ressalva que faço é que sua irmã seja convidada a assumir um cargo técnico na sub Prefeitura.  Ela é bióloga , estou certo?  A sub Prefeitura terá uma secretaria específica para o meio ambiente.  Estamos estudando, eu fiz alguns rabiscos , aqui mas vou agendar uma reunião com sua irmã.   Gostou da ressalva?

____Olhe ! Estou até chocada! Creio que nem Gervásio esperava por esta. O que você tem a dizer, meu jovem amigo?
_____Quais são as minhas ressalvas, Prefeito?

_____ São questões técnicas e trata-se do Estatuto Social da nova empresa que será criada.   Como a Prefeitura tem interesse e irá apoiar o seu Projeto que também contará com Financiamento Bancário que é oferecido pelo Governo Federal, você terá que juntamente com os cooperados formalizar a nomeação da primeira diretoria da empresa de inseminação.   Você ,talvez pelo ineditismo, ou por ser digamos ''marinheiro de primeira viagem''  esqueceu que a filosofia do cooperativismo , impede a princípio, que você centralize decisões em você.   Todos são participantes e todos decidem conjuntamente, e cabe a Prefeitura ter conhecimento de tudo o que irá acontecer daqui por diante, há necessidade de abordar outras questões que não serei enfadonho de abordar agora.  Convido vocês a irem comigo ao Banco Agropecuário obter todos os dados e este não deixa de ser um acontecimento extraordinário, este da empresa de inseminação, o outro da sub Prefeitura e o ápice na construção da Ponte.    Claro , tudo não irá acontecer da noite para o dia, mas estou firmando este acordo! Podemos nos dar as mãos ? Disse o Prefeito Josias Bastos ficando de pé

             Gervásio e Maria Augusta queriam beliscar-se.
        Levantaram-se e estenderam juntos as mãos ao Prefeito.

              O que mais Gervásio poderia esperar, se a reunião saiu melhor do que a encomenda, como diz o ditado, um pouco alterado mas perfeito para o momento feliz? O Prefeito Josias Bastos caminhando ao meio abraçava-os como se abraçam velhos amigos. Gervásio capturou alguns biscoitos amanteigados, mais alguns guardanapos e guardo-os no bolso da sua jaqueta.
             Despediram-se na porta que distava  6(seis) metros da entrada principal. O Prefeito ficou ali, plantado, acenando. Lembrava o ex-Presidente Juscelino acenando ao eleitorado, provavelmente estava ensaiando sua reeleição, sendo visionário, aquele que enxerga mais além.   
             Os dois acenaram de volta e entraram no carro.
_____O que você tem aqui em cima no bagageiro? perguntou Maria Augusta.
_____Reparou? É uma caixa de tilápias com gelo. Vou abrir as janelas. Dentro do carro ficou mais frio, né?
_____Gervásio, me conta, ou me belisque, se é que não me beliscou lá dentro. O que foi isso?
O que eu ouvi foi verdade? Será um sonho?
_____Sinceramente, Maria eu estou tão surpreso quanto você! Sei apenas que ele disse algo que aconteceu: Sinto-me mais leve e feliz.   Iremos com ele ao Banco Agropecuário e depois de conversarmos com o Diretor do Banco ou Gerente responsável, ai sim, vou acreditar em tudo.  Ele disse que não foi discurso de campanha. Quanto ao Projeto ele será posto em votação durante a semana. Espero vê-la conosco.
_____Sim, eu irei e minha irmã virá comigo.

_____Antes que eu ligue o carro, quer guardar algumas caixas de leite ai em cima? Eu tenho aqui uma pequena lona de plástico para embrulhar. Assim suas caixinhas não ficarão com cheiro de peixe.

       Gervásio conseguiu acondicionar mais da metade do que havia no carrinho, entrou novamente e partiram em direção à balsa que mais uma vez demoraria uma hora para levar Maria Augusta de volta ao Mangue.

               
         

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